Os diálogos menos civilizados de hoje
Tem uns três ou quatro anos que li a respeito disso: “após o surgimento da web 2.0 nos tornamos menos tolerantes às opiniões e pessoas que nos contrariem”. Isso não vale apenas para a internet, e se agrava conforme temos menos intimidade com a outra parte do debate.
Com a explosão de fóruns, chats , notícias com comentários e, principalmente, comunidades virtuais tornou-se muito fácil encontrar alguém que concorde exatamente com o que pensamos sobre um determinado assunto. Também está muito fácil esculachar e dispensar quem discorda. A impessoalidade fria da internet leva a isso. O fim dos debates cara-a-cara perdemos a noção que difere o que é opinião e o que ofensa, nos dois sentidos do fluxo da conversa. Ofendemos e nos sentimos ofendidos por qualquer coisinha.
Como disse, li sobre isso anos atrás. Concordei no ato e já comentei sobre isso com muita gente.
Mas, a duas semanas atrás, comecei a prestar a atenção como essa teoria funciona na prática. lancei o seguinte apelo no Facebook: “alguém tem um flickr legal para me indicar? Onde não tenha apenas fotos de gatos ou comida?”
Uma grande amiga, leitora regular deste blog me perguntou se eu tinha algum preconceito contra gatos. Respondi não tinha nada contra, mas que fotos de animais de estimação e crianças são apreciadas apenas pelo dono e pelo fotógrafo. Então ela discordou e o debate morreu aí.
Lembrei-me logo depois que essa minha amiga tem um filho de quase um ano, e ela e o marido sempre postam fotos da criança no Facebook. Não sei se o casal se ofendeu com o comentário (e espero que não), mas não seria surpresa alguma se acontecesse. Eles não viram minha cara ne ouviram minha vóz no momento no qual me pronunciei.
A partir daí lembrei de várias discussões online na qual parti para opiniões radicais e notei intransigência recíproca. Vários exemplos de comentando notícias no UOL, comunidades no Orkut, bate-bocas nos antigos chats da Brasil2000 fm.
Então ampliei o foco da reflexão e percebi que este comportamento não se restringia à WideWorldWeb. Lembrei-me de algumas conversas recentes com colegas, nas quais ambas as partes e excederam e por pouco não se transformaram em brigas. Assim como na internet, temos a sensação que não precisamos mais dialogar na vida real. Podemos pensar e falar qualquer coisa sem ouvir ninguém. Não somos obrigados a concordar com nada.
Sabe aquele ditado “opinião é que nem bunda; cada um tem a sua”? Nunca isso foi tão verdade como atualmente. A Teoria dos Jogos, que rendeu a John Nash o Prêmio Nobel de Economia diz que “numa negociação cada parte deve buscar o melhor para si e para o grupo”, ou seja, se todos ganham ao abrir mão de algumas coisas, um acordo se torna mais viável. mas por que concordar se o Google sempre lhe apresentará alguém que lhe dê razão?
Não dá para negar que o poder de reunir pensamentos iguais é uma das virtudes da internet. Ajuda a combater abusos políticos. A lutar contra abusos comerciais. A conciêntizar as pessoas sobre seus direitos e deveres.
Por outro lado, a simples liberdade de expressão não garante a liberdade de opinião. Esta nasce da liberdade pensamento, da capacidade de arrependimento, da tolerância ao diálogo, da disposição a ouvir e considerar a opinião alheia.
Estamos perdendo nossos valores de liberdade de pensamento e opinião. Os valores que criaram a democracia tem muito mais a ver com ouvir do que ser ouvido. Ninguém precisa vomitar uma opinião em cima de outra pessoa. apenas podemos oferecer-la aos nossos iguais e, se concordarem ótimo. Se não você é obrigado a ouvir o que os seu iguais dizem. E em caso de impasse, não há saída, além da negociação.